Auditório da OAB foi palco de discussões sobre temas relevantes para o desenvolvimento do Amapá.
A OAB/AP realizou, no último dia 29 de abril, o 1° Fórum Amapá 360° de bioeconomia. A iniciativa e organização foi da Comissão do Meio Ambiente presidida pelo Dr. Thoni Furtado e o objetivo do debate foi conectar natureza, tecnologia e negócios.
Dentre os convidados para compor a mesa, estava João Alvarenga, que foi Presidente do Sebrae durante 20 anos. Ele disse que a economia do contra-cheque é boa, pois é dinheiro. O problema é que esse dinheiro não fica no Estado, pois o que consumimos não é produzido aqui. Segundo Alvarenga, a questão do Petróleo em 2013, foi completamente abafada pelo Governo e outras entidades importantes, à época, e que deveriam ter feito uma ampla divulgação. "Quando estávamos na feira do Petróleo no RJ, fomos perguntados sobre isso, e o Sebrae não estava sabendo de nada" , contou.
João Alvarenga também fez uma retrospectiva sobre alguns momentos vividos na economia do Amapá, como a questão madeireira, depois, o agronegócio, que foi o período da soja, e agora o petróleo. Ele alertou que precisa de planejamento e entendimento da sociedade. "Que a bioeconomia não seja só uma febre acompanhando a onda do petróleo. Quem não sabe o que quer e não sabe para onde vai, não chegará a lugar nenhum" alertou.
O presidente da Comissão do Meio Ambiente da OAB/AP, Dr. Thoni Furtado, falou que a iniciativa do evento visa preparar o Amapá para que ele seja exemplo para o mundo através da bioeconomia, inovação e tecnologia aliadas à natureza.
"Não podemos ser um museu para o mundo" disse o Prof. Gesiel.
Dr. Gesiel Oliveira, geógrafo e especialista em Geopolítica Mundial, falou sobre como conciliar desenvolvimento econômico e conservação ambiental. Ele enalteceu o que só existe no Amapá, sendo um Estado privilegiado em diversos aspectos, dentre eles, estarmos em frente ao majestoso Rio Amazonas, que é o maior em tudo, quantidade e variedade de peixes, em vazão de água, é o mais largo, tendo abaixo dele um outro rio do mesmo tamanho, o Rio hamza, também de águas correntes.
Gesiel Oliveira destacou que a rocha mais antiga que existe, com uma variedade gigantesca de minerais, coincidentemente está em uma grande reserva - o Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque. Lugar que só entra com autorização do Ibama e que sequer podemos usar para Ecoturismo. Segundo ele, essa reserva foi o maior estelionato ambiental que o Amapá sofreu.
"Somos o Estado mais preservado do Brasil. A pergunta é: o que ganhamos com isso? É possível sair dessa visão de preservação total absoluta e usar de uma maneira racional esses recursos. Não podemos ser um museu para o mundo", disse ele.
Gesiel destacou a posição estratégica do Amapá, pois somos o Estado mais próximo do Canal do Panamá que é a principal rota comercial. Falou também sobre a Renca que tem muito ouro, ferro, cobre e outros minerais.
O geógrafo criticou as burocracias, as taxas e tarifas que atrapalham quem quer investir no Estado. "Laranjal do Jari só pode utilizar 5% da sua área espacial. Como vamos pensar em desenvolvimento desse jeito? O pior IDH é em Melgaço, um município da riquíssima Amazônia" lamentou. Dr. Gesiel disse que o Brasil tem 97% das reservas de nióbio do mundo e não explora, enquanto o Canadá tem 3% e está aproveitando tudo, inclusive produzindo os produtos fabricados com o metal, agregando ainda mais valor para a sua economia.
Gesiel destacou o açaí do Amapá que não é aproveitado comercialmente, sendo 97% da produção consumida aqui. Enquanto o Pará é responsável pela exportação de 95% do açaí do Brasil.
Como retrato da situação econômica do Amapá, Gesiel disse: "os chineses estão vindo pescar em nossa Costa e levam nossos peixes embora. Enquanto não tem gelo para colocar o peixe que é pescado em Calçoene". Ele finalizou, dizendo que há muito a ser feito para o povo do Amapá ganhar muito dinheiro, inclusive não só através das nossas riquezas naturais, mas das nossas belezas, com ecoturismo.
A indústria petrolífera é fundamental para auxiliar nesse processo de transição energética", diz Prof. Elissandro Lopes.
O Prof. Elissandro Lopes, Especialista em Gestão Estratégica de Petróleo, Gás e Energias Renováveis, falou das potencialidades de matrizes energéticas do Amapá, destacando o crescimento de empresas de energia solar. Disse que, mesmo sem o petróleo, o Amapá passa por uma curva de desenvolvimento e, com a indústria petrolífera, essa curva se acentua. Ele esclareceu que a transição energética deve ser feita de forma justa, equitativa e ordenada, conforme estabelecido na COP 28, e que a indústria de Petróleo e Gás é necessária e precisa auxiliar nesse processo de transição.
Dr. Marcelo Moura alertou que é preciso cuidar do meio ambiente urbano para prevenir doenças.
Dr. Marcelo Moura, Presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia/AP, falou sobre os desafios para a saúde física e mental do amapaense frente às novas perspectivas da economia. Ele deu um panorama da situação da saúde no Estado. Dentre alguns dados estão: o crescimento de 76% do número de médicos nos útimos 13 anos. Há 1.113 médicos ativos no Amapá em 2025, 92% atuam na capital, e o restante, nos outros 15 municípios. A preocupação é se o Estado conseguirá oferecer atendimento em saúde diante das demandas que se avizinham. Ele disse que apesar da preservação de boa parte do território, não há uma educação ambiental na sociedade, o que afeta diretamente a saúde. Apenas 32,9% da população do Estado tem acesso à água potável, e apenas 6,8% dos domicílios têm acesso ao esgotamento sanitário. A destinação final do lixo é inadequada, não há uma coleta seletiva, causando desperdício e contaminação do solo e da água.
Dr. Marcelo também alertou sobre várias doenças transmitidas pela água como doenças respiratórias, problemas neurológicos, renais, cardiovasculares e câncer. Um exemplo que ele deu de impacto das atividades econômicas na saúde, foi a água contaminada por chumbo, mercúrio e cádmio que causa alterações nas funções cognitivas, alterações comportamentais, dificuldade de concentração e depressão. O Dr. Marcelo levou à reflexão de que é necessário o Estado ter políticas públicas que garantam a prevenção de doenças, cuidando do meio ambiente urbano, e também tenha suporte para oferecer diagnóstico e tratamento, considerando o aumento populacional que as novas atividades econômicas promoverão.
O Mestre em Arquitetura Tiago Pereira falou sobre arquitetura bioclimática e a necessidade desse olhar nos projetos
O Prof. e Mestre em arquitetura Tiago Pereira, falou sobre a arquitetura bioclimática. Analisou algumas tendências que não estão levando em consideração a questão da temperatura, como excesso de vidros nas fachadas de residências e prédios comerciais que aumentam o calor e, consequentemente, o consumo de energia, sobrecarregando os aparelhos que garantem a permanência humana nesses ambientes, diminuindo a vida útil deles. A reflexão feita foi que as futuras construções precisam ter um olhar mais técnico nesta questão climática. Ele esclareceu que, se for replicado o que já tem sido feito, sem considerar o quanto um determinado modelo de edificação pode aumentar a temperatura do ambiente interno e piorar o calor, já característico da região, haverá problemas de várias ordens, inclusive a inutilidade de alguns espaços.
"Não podemos comoditizar os ativos biológicos amazônicos", disse o Prof. Dr. e Designer José Luiz de Paula Junior
O Professor e Desinger José Luiz de Paula Junior falou sobre a marca, sobre o design como grande patrimônio que alguém tem. " Quem tem uma marca, tem um patrimônio fantástico que pode ter um valor econômico. Mas sem boa reputação, não há marca de valor. O caminho é agregar valor naquilo que se produz. Temos que começar a produzir com valor agregado. Inovação, não é, necessariamente, tecnologia. Ela é comportamental" disse o Dr. José Luiz, líder do Instituto dos Sentidos, com sede em São Paulo e em Paris. Para ele, não há necessidade de ter grande produção. "Podemos produzir pouco, muito bem e com valor agregado. Escalar a produção sem marcar é comoditizar" explicou.
O designer José Luiz cria marcas há 47 anos e deu o exemplo dos Estados Unidos que usa muito bem a imagem do índio relacionada a ideia de potência, de força, como as marcas de carro CHEROKEE E PONTIAC originadas do índio nativo americano.
O alerta maior que o Prof. José Luiz fez foi que não podemos comoditizar os ativos biológicos amazônicos. Ele deu exemplo de várias marcas que ele criou com produtos fabricados por indígenas ou que são nativos de sua região, que vão desde feijão, farinha com açafrão, até perfumes. Ashaninka, Puyanawa e Yawanawa são exemplos de marcas criadas por ele em parceria com povos indígenas. "Um perfume desses é vendido a 120 euros. Isso é agregar valor", esclareceu. Dr. José Luíz conta que ele pega o conhecimento dos indígenas e transforma em valor agregado e 50% do lucro líquido desses projetos fica com eles.
Ele observou que é importante a comunicação visual para cada aldeia. A partir do momento em que cada aldeia tem uma identidade visual, ela passa a agregar valor ao que ela produz. José Luiz criou o selo regional que define a origem do produto. "A farinha com Açafrão, que foi uma invenção para deixar o produto mais bonito, acabou sendo uma farinha nutracêutica.. Quando entra na esfera de combinar cultura e conhecimento, sempre será um resultado positivo".
Para José Luiz, o papel do designer é transformar a humanidade. "Os dois agentes transformadores: o útero e o designer. O designer que não cria elementos para transformar a humanidade, ele não pode ser chamado de designer. Tudo que você está usando, foi um designer que inventou" afirmou. Ele disse ainda que o Pracaxi é um óleo sagrado que é mal explorado e vira comodities. "Coloca numa embalagem, conta uma história. As pessoas não compram produto, elas compram histórias" estimulou.
"Eu transformei um ouriço de castanha do Pará em uma vela de luxo. Temos que ensinar nossos jovens a desenvolver produtos. Temos que criar um grande movimento no Amapá para ensinar aos jovens o design" avisou.
Ele finalizou falando sobre a tendência cada vez maior do conceito de luxo ser algo que é sustentável. A sustentabilidade tem se tornado prioridade entre as grandes marcas de luxo, o que faz da Amazônia um potencial gigantesco pelos seus produtos naturais sustentáveis que precisam ter um valor agregado, urgente. Quem é da Amazônia precisa perceber a importância de cada um dos seus produtos e fazer deles um grande negócio perante um público de consumidores em que 80% deles adotam comportamentos sustentáveis.
"A Macaúba está presente em todos os biomas do Brasil. Não conhecemos nossas riquezas" disse Maurício Conte.
O Prof. Mestre em Engenharia Maurício Conte, deu uma aula sobre a macaúba, a super palmeira para o futuro sustentável da Margem Equatorial. Fazendo um comparativo da receita do agricultor por hectare, em dólar, ele disse que o gado tem um retorno de $ 232, o milho $ 874 , a soja $ 971, o café $ 5.170, enquanto a macaúba, o retorno por hectare é de $ 25.897.
Para o Prof Maurício, o dinheiro do petróleo deveria ir para a pesquisa de bioeconomia. O Brasil está em primeiro lugar entre os países mais biodiversos, mas não está nem entre os dez primeiros países com patentes em biotecnologia.
Maurício conta que a macaúba é a super palmeira rainha dos óleos. Dela, podem ser extraídos o óleo, o biodiesel e a glicerina. "Conversando com um produtor rural de Rondônia, ele disse que cortou vários hectares de macaúba porque tem espinhos. Ele não sabia que dava para fazer óleo. Sabia apenas que o boi come. Nem mesmo conhecemos nossas riquezas", lamentou.
Maurício alerta que a Comunidade Europeia já está exigindo querosene verde para os aviões. "Onde vai produzir essa demanda no mundo? Os lugares com potencial são a África, mas falta estrutura, o Sudeste Asiático, mas enfrenta problemas para certificar, e a América do Sul, cujo grande país é o Brasil. Uma oportunidade de exportação para a Europa que é o grande consumidor. Os aeroportos brasileiros que recebem vôos internacionais vão ter que cumprir essa exigência" frisou.
Para Maurício, é preciso explorar petróleo e usar o dinheiro para recuperar pastagens e criar uma cultura nova, e a macaúba vai criar um segundo andar na mesma área de pastagem. "Você aproveita tudo na árvore. A casca, você queima, a polpa, você extrai e o resíduo alimenta o gado. Além disso, a palmeira também promove sombra para o gado, evita que o vento arraste a água e garante ração para dá para o gado na seca", finaliza.
Benoit Schohv falou sobre manter a floresta de pé e recuperar o que foi devastado ilegalmente.
O ambientalista francês Benoit Schohv, da Nature Rights, falou sobre mudanças climáticas e previsões. O evento foi encerrado com a participação do Secretário Nacional do Meio Ambiente, Adalberto Maluf, por vídeo gravado, devido a impossibilidade de estar presente. Ele agradeceu a iniciativa da OAB e espera que outros debates como esse continuem acontecendo. O evento teve um elevado nível de informação e troca de experiências. Os participantes receberam certificado. Você confere o evento na íntegra pelo link abaixo:
{https://www.youtube.com/watch?v=oAJrvfRsoCM}{/youtube}
Adriana Garcia
Jornalista na Amazônia